Brasília – Indicado para assumir
a coordenação do Grupo de Monitoramento Carcerário do Tribunal de Justiça do
Maranhão, o juiz da Vara de Execuções Penais Fernando Mendonça considera “um
tiro no pé” a transferência de líderes e integrantes de facções criminosas que
cumprem pena no sistema prisional maranhense para presídios federais em outros
estados.
A medida foi proposta
pelo Ministério da Justiça após detentos do Complexo Penitenciário de
Pedrinhas, em São Luís, ordenarem ataques a ônibus e delegacias da capital, e
prisioneiros do complexo serem assassinados. O governo estadual aceitou a
proposta e está selecionando quem irá para outras localidades, mas, por razões
de segurança, não revela quando isso deve acontecer.
“Estamos
dando um tiro no pé”, disse o juiz à Agência Brasil. Para o magistrado, o risco
de transferir presos de um estado para outro é facilitar o convívio entre
membros de diferentes grupos, permitindo a troca de experiências e a
capacitação criminosa. “O sistema carcerário brasileiro é hoje responsável pela
capacitação, profissionalização e doutorado do crime. Isso no país inteiro”,
afirmou.
De
acordo com Mendonça, a proposta de transferir presos violentos ou perigosos
surge cada vez que problemas como esse ocorrem. No Maranhão, a medida foi
proposta em 2002, quando vários presos do mesmo complexo penitenciário foram
mortos durante uma rebelião. Segundo Mendonça, a ideia não se concretizou,
devido à resistência de magistrados e de outras autoridades. Duas celas de segurança
máxima foram, então, criadas para abrigar os presos mais perigosos e violentos.
“Batemos
o pé e dissemos que não mandaríamos os presos para fora. Com isso, conseguimos
evitar, por quase cinco anos, que as facções criminosas se consolidassem no
estado”, disse o magistrado ao explicar que, a partir do final de 2007, presos
maranhenses começaram a ser transferidos para outras unidades da Federação.
“Depois disso, eles voltaram especializados, recrutados pelas organizações
criminosas, e começaram a criar células criminosas que terminaram por gerar as
atuais facções que atuam no estado.”
Para
o magistrado, uma opção seria transferir as presas da Penitenciária Feminina em
Pedrinhas para outro estabelecimento e usar o local para abrigar os presos, em
vez de levá-los para outros estados. Construída a partir de 2007, a unidade
feminina tem 210 vagas. “Boa parte das mulheres poderia cumprir pena em prisão
domiciliar. As demais são de baixa ou média periculosidade”, ressaltou
Mendonça, que disse ter apresentado a ideia à Secretaria de Segurança. “Eles
disseram que o Depen [Departamento Penitenciário Nacional, do Ministério da
Justiça] não permitiria, pois [os recursos federais usados na construção da
penitenciária] foram autorizados para o presídio feminino. Isso é impensável em
uma situação como a que estamos vivendo.”
Para
ele, a situação do sistema carcerário maranhense é resultado de uma “gestão
amadora”. “Historicamente, a gestão penitenciária tem sido feita por pessoas
que não têm a qualificação técnica adequada. Até este ano, não tínhamos uma
escola de gestão penitenciária, o que prejudicava a formação de agentes
penitenciários e de diretores de presídios”. Os problemas, no entanto, não se
limitam ao estado, apesar de o Maranhão apresentar alguns dos piores indicadores
sociais do país. “É um problema do país”, resumiu, ao elogiar o atual
secretário estadual de Justiça e Administração Penitenciária, Sebastião Uchoa.
Segundo
o magistrado, a “contaminação” de funcionários do sistema explica como
armamentos, drogas e celulares continuam sendo encontrados no interior do
presídio, mesmo após a chegada da Força Nacional e da Polícia Militar. “Este
ano estamos vendo coisas que estão se repetindo o tempo inteiro desde 2002,
quando houve uma primeira grande rebelião, com a morte de mais de uma dezena de
pessoas e a decapitação de três presos. Houve um intervalo, uma nova rebelião
violenta em 2009, mais duas em 2011 e essas recentes.”
De
acordo com Mendonça, mais de 12 mil mandados de prisão aguardam cumprimento no
estado. É quase o dobro do total de presos maranhenses. Com 24 estabelecimentos
prisionais, o estado tem cerca de 5,5 mil presos. O déficit prisional, de
acordo com o juiz, chega a quase 2 mil vagas. Só Pedrinhas, que dispõe de 1,7
mil vagas, abriga cerca de 2,2 mil presos. Mendonça informou que em torno de
mil presos cumprem pena em delegacias de polícia.