Levantamento sobre mortes ocorridas no campo por
consequência de conflitos agrários aponta que 34 pessoas foram assassinadas em
2013, sendo 15 delas indígenas. O número de índios mortos nessa circunstância é
o maior já registrado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), que desde 1985
divulga esse tipo de estatística.
A maior parte dos óbitos de índios (5) ocorreu em
Roraima, com Yanomamis. Em seguida, vem a Bahia (4), onde uma disputa antiga
entre fazendeiros e Tupinambás no sul do estado obrigou o governo federal a
enviar a Força Nacional para conter a violência.
Mato Grosso do Sul registrou três mortes de
guaranis. Amazonas, Pará, Paraná tiveram uma morte de indígena cada. As demais
vítimas, um total de 19, são posseiros, sem-terras, trabalhadores rurais,
pescadores e assentados.
Os dados a que o G1 teve
acesso fazem parte do relatório “Conflitos no Campo Brasil 2013”, que será
lançado na próxima semana. Segundo a CPT, a morosidade por parte do governo
para demarcar territórios para povos nativos foi o estopim para os conflitos.
O Ministério da Justiça afirma trabalhar na
instalação de mesas de negociação para alcançar um diálogo entre as partes e
coibir as disputas.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) diz que
processos de demarcação de terras indígenas estão em andamento e reconhece a
necessidade de se criar mais territórios para os povos no Centro-Sul, Sudeste e
Nordeste, onde vivem 554 mil índios.
A Secretaria de Direitos Humanos, ligada à
Presidência da República, informou que 99 indígenas ameaçados de morte foram
incluídos no Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, que fornece
proteção especial. A lista total tem 417 nomes.
417 defensores ameaçados de morte estão em lista de
proteção do governo federal; deste total, 99 são indígenas
Motivos
Os dados foram levantados por agentes da CPT
distribuídos nos estados e cruzados com informações publicadas em diversos
veículos de mídia. O estudo é feito desde 1985. Os conflitos, segundo o
relatório, ocorrem principamente com madeireiros, mineradores, grileiros, além
do próprio governo federal, com a instalação de grandes obras de
infraestrutura.
O documento diz ainda que, das 15 tentativas de
assassinato no campo, 10 foram com indígenas; das 241 ameaças de morte registradas
pelos agentes, 34 foram direcionadas a índios e, das 143 prisões efetuadas em
decorrência das disputas por terra, 36 ocorreram com indígenas.
Segundo Isolete Wichinieski, da coordenação
nacional da comissão, as mortes aumentaram em consequência da demora na
aprovação de novas áreas demarcadas especialmente para os índios, serviço
realizado pela Funai. "A principal garantia de sobrevivência dessas
comunidades é a defesa de seu território. O governo tem que garantir",
explica.
Cleber Buzzato, secretário-executivo do Conselho
Indigenista Missionário (CIMI), confirma que o não prosseguimento das
demarcações de terras para os índios é um dos motivos, mas ressalta que
realização de discursos inflamatórios que incitam a violência contra as
populações de diversas etnias é outra causa.
Ele cobra do governo o cumprimento da Constituição
e a continuidade da demarcação, com a publicação de portarias que definem onde
estão os territórios. “Cria-se uma demanda na comunidade por ações políticas.
Parte dessas ações se traduzem na retomada de parte de suas terras”, explica.
Novos
territórios em estudo
Segundo a Funai, atualmente há 426 terras indígenas
regularizadas, que representam 12,2% do território nacional. Mas a maioria
delas (98,75%) se encontra na Amazônia Legal, enquanto que 554.081 dos 896.917
índios existentes no Brasil, segundo o Censo do IBGE de 2010, estão nas outras
regiões, que concentram 1,25% da extensão de terras indígenas demarcadas.
A fundação tem conhecimento dos conflitos
envolvendo regularização fundiária, “sobretudo em áreas cujo processo de
colonização é mais truncado”, e afirma que estão em andamento processos para
determinar novos territórios apenas para os índios.
Atualmente há 128 estudos para criação de
novas áreas indígenas e processos ainda não concluídos que destinariam 64,7 mil
km² do território do país a diversas etnias indígenas.
De acordo com a Secretaria de Direitos
Humanos, 99 índios de todo o país, ameaçados por envolvimento em conflitos
relacionados à demarcação e regularização de terras, recebem proteção especial.
Eles foram incluídos no Programa de
Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, que não está voltado apenas à
proteção da vida e da integridade física deles, mas, segundo a SDH, foca também
na articulação de medidas e ações que refletem nas causas que geram as ameaças
e as situações de risco.
Entre elas está a realização de audiências
públicas para a solução de conflitos, divulgação do trabalho do defensor,
acompanhamento de investigações e denúncias, além da retirada provisória do
defensor do seu local de atuação, em casos excepcionais.
O Ministério da Justiça informou que
atualmente há mesas de negociação para conter conflitos entre índios e
agricultores em Santa Catarina e Mato Grosso do Sul. Nos próximos dias, o mesmo
tipo de instrumento vai ser instalado no Rio Grando do Sul.
Bahia: um caldeirão prestes a
explodir
Um dos conflitos mais acirrados em
andamento acontece no Sul da Bahia, onde os Tupinambás pedem a demarcação de
uma área de 480 km², localizada em Ilhéus, Una e Buerarema, que seria
originalmente ocupada por eles. O local abriga 600 propriedades rurais, de
agricultores que não querem deixar as suas terras e ter prejuízo com a produção.
No ano passado, quatro índios foram mortos
no segundo semestre e, por conta disto, homens da Força Nacional de Segurança
seguiram para evitar mais homicídios.
Ele teve a prisão temporária decretada
pelo juiz da Vara Criminal de Una por ter sido supostamente o mandante do
assassinato do produtor rural Juraci dos Santos Santana, de 44 anos. O
agricultor foi morto a tiros por quatro homens no dia 10 de fevereiro deste
ano. O cacique nega participação no crime e, segundo ele, decidiu se entregar
em Brasília porque teme ser assassinado na cidade baiana.
Buzzato, do CIMI, afirma que o conflito agrário na Bahia
poderia ser resolvido com a publicação de uma portaria, por parte do Ministério
da Justiça, que delimita a área onde os índios podem viver – o que acarretaria
na retirada de qualquer não-índio, com provável indenização.
Um estudo elaborado pela Funai sobre a
área (que causou divergências entre o órgão e o MJ, mas que depois foi aceito
pelo ministério) norteou a elaboração da portaria que vai ser base para outros
processos de demarcação pelo país, incluindo dados sobre indenizações a
agricultores. No entanto, segundo o MJ, não há previsão para o documento ser
publicado no Diário Oficial da União e, com isso, virar normativa no Brasil.
Ainda de acordo com o ministério, uma mesa
de negociação para que índios e agricultores dialogassem foi instalada no
estado, reunindo diversas lideranças, o que, segundo o governo, esfriou os
ânimos até que a portaria passe a valer.
