Sempre
ocupando os últimos lugares nas pesquisas sobre saneamento básico feitas no
país, o Maranhão oferece cobertura de esgotamento sanitário a apenas 16,39% dos
seus cerca de 6,79 milhões de habitantes (só 1,11 milhão de pessoas atendidas),
de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na
capital, São Luís, apenas 45,57% da população de 1.027.430 pessoas (468.199
indivíduos) são assiatidas por rede de esgoto, segundo a ONG Trata Brasil.
O assunto foi um dos principais temas do Seminário
Interfederativo sobre Saneamento Básico e Metropolização, que reuniu em São
Luís 12 prefeitos, além de secretários municipais, para discutir políticas
públicas destinadas a atacar o problema. Ínfimos 6,5% dos municípios do estado
(14 cidades) contam com esgotamento sanitário. O Maranhão só ganha do Pará
(6,3% dos municípios com saneamento) e do Piauí (4,5%).
RIO DE FEZES’ – Em São Luís, uma vala extensa corta o
bairro da Areinha e outros próximos ao centro, espalhando mau cheiro e
carregando lixo de todo tipo (inclusive muitos móveis e sucatas de carros,
jogados por moradores), fezes e animais mortos (bois, vacas, ovinos, gatos,
cães). O “rio de fezes” desemboca no mangue que circunda a capital maranhense –
que insiste em sobreviver, apesar da agressão diária –, e de lá a água fétida
vai para o mar.
Às margens da vala, em meio à sujeira, é possível encontrar,
todos os dias, vacas, bois e outros animais pastando.
O morador Adriano Rocha Alves, de 47 anos, contou que a vala foi
construída pelo Estado há mais de três décadas. “Não resolveu o problema do
esgoto de São Luís; só serviu para contaminar a Barragem do Bacanga, o mangue e
o mar”, disse Adriano.
O comerciante Aguinaldo Avelar, 65, outro morador da Areinha,
afirmou que muitos gestores públicos – prefeitos e governadores – prometeram
cobrir a vala, mas as palavras nunca saíram do papel.
Sem saída, moradores da Areinha têm de se acostumar a conviver
com moscas, mosquitos, baratas, ratos e até cobras que aparecem, de vez em
quando, na vala. Sem contar as doenças, como dengue, diarreia, coceiras e
micoses.
“Minha mulher já contraiu
dengue e as crianças daqui vivem com doenças de pele e disenteria”, disse
Aguinaldo.
PRAIAS – Nas praias do Olho d’Água e do Caolho –
as mais poluídas da orla de São Luís, segundo a Secretaria Estadual de Meio
Ambiente (Sema) – curiosamente é um dos poucos locais do Maranhão em que há uma
rede coletora e uma estação de tratamento de esgoto. O problema é que o projeto
nunca cumpriu sua função desde quando foi inaugurado pela Companhia de
Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema), há pouco mais de cinco anos.
Dessa forma, os dejetos in natura que chegam à estação não são
tratados. Em vez disso são lançados diretamente no Rio Pimenta, às margens do
qual está localizada a estação, e de lá vão para o mar. Misturado ao esgoto, o
Pimenta virou um “meio de transporte” de toneladas de fezes e outros detritos,
lançados diariamente nas praias ludovicences.
Segundo
Francilene Santos, 35, que nasceu e cresceu no Caolho, “antigamente era
possível ver o fundo do Rio Pimenta, com seus peixes, siris e até jacarés”.
Atualmente, diz ela, “só se vê muita espuma, vinda das
lavanderias dos hotéis da região”.
“Eu não entro mais no mar, pois já contraí coceira, frieira e
outras micoses”, afirmou Francilene.
O surfista Francisco Olímpio, 26, contou que surfa na praia do
Caolho há três anos, por ser um dos melhores locais para praticar o esporte, e
que não teme mais as doenças. “Já peguei várias doenças de pele, mas acredito
que já criei anticorpos, o corpo acostumou”.
JAMBEIRO – Outro bairro castigado pela falta de
saneamento básico é o Jambeiro, na área Itaqui-Bacanga – a mais populosa de São
Luís. A dona de casa Francisca Pereira, 59 anos, moradora da Rua Cruzeiro do
Sul, contou que em algumas casas do Jambeiro existem fossas. Porém, em outras
os dejetos fecais vão direto para a rua, o que provoca odor, sujeira e doenças.
Na Rua São Paulo, a situação é a mesma. A dona de casa Neurimar Silva,
41, informou que não tem fossa, mas o marido fez uma encanação para conduzir os
dejetos para uma vala.
“O nosso esgoto vai da vala para um mangue, atrás de nossa casa.
Porém, isso não resolve os nossos problemas, pois o povo das outras casas joga
esgoto direto na rua. Quando chove, é um deus-nos-acuda. Já vi fezes espalhadas
no chão várias vezes. Doenças não faltam. Eu e meus filhos fomos contaminados
por dengue, e vivemos com coceira e outras micoses”.
Alguns moradores da rua construíram pequenas pontes para poder
chegar a suas casas sem ter de pisar no esgoto.
Para o consultor da Associação Nacional dos Servidores de
Saneamento, Wladimir Ribeiro – que participou do Seminário Interfederativo
sobre Saneamento Básico e Metropolização –, o problema do saneamento em São
Luís é a opção por sistemas separados, e não integrados, no tratamento do
esgoto.
“Se não houver um planejamento que permita que essa questão se
normalize ao longo do tempo, cada vez vai ficar mais difícil que São Luís tenha
um saneamento adequado”, disse o consultor.
Do jornal pequeno