
Pelo menos 53 índios foram
assassinados durante o ano de 2013 em consequência de conflitos, diretos ou
indiretos, pela disputa por terras. O dado faz parte do relatório sobre a
violência contra os povos indígenas brasileiros que o Conselho Indigenista
Missionário (Cimi) divulgou hoje (17), em Brasília. Dos casos registrados em
todo o país, 33 ocorrências (66%), foram registradas em Mato Grosso do Sul. Há
anos o estado figura como o mais violento do país no relatório da organização
indigenista, vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O total de índios assassinados em 2013 é menor que os 60 casos identificados
pelo Cimi em 2012. No entanto, como em anos anteriores, a organização alerta
que os números podem estar subestimados, porque são colhidos, a partir várias
fontes, como relatos e denúncias dos próprios povos e organizações indígenas;
missionários do conselho; reportagens de jornais, sites e agências de notícias; órgãos
públicos que prestam assistência; Ministério Público, além de relatórios e
boletins policiais.
No capítulo violência contra a pessoa, o Cimi identificou 13 homicídios
culposos (não intencional) em 2013, contra 12 casos em 2012; 328 tentativas de
assassinato, contra 1.024, além de 14 casos em que índios foram ameaçados de
morte. O elevado número de tentativas de morte se deve ao fato de que, em
algumas ocorrências, a ameaça foi dirigida a toda a comunidade. O relatório de
2013 também registra 10 casos de violência sexual praticada contra indígenas.
O relatório também aponta que 8.014 dos 896.917 índios brasileiros (dado do
Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2010) sofreram
algum tipo de violência decorrente da omissão do Poder Público. Os casos são de
falta de assistência escolar, de saúde, falta de políticas públicas que impeçam
a disseminação de bebidas alcoólicas e outras drogas entre a comunidade e até
tentativas de suicídio. O resultado nesse quesito é inferior aos 106.801 casos
registrados em 2012.
O relatório indica que os índios continuam sendo alvo de racismo e preconceito.
Além disso, crianças indígenas continuam morrendo por doenças como pneumonia,
diarreia e gastroenterite, insuficiência respiratória, infecções provocadas por
bactérias, entre outros males. Novamente, o Cimi destaca a dificuldades para se
chegar aos números reais de casos. Enquanto o relatório contabiliza apenas 26
casos de mortalidade infantil, o texto de apresentação do documento cita dados
da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e do Ministério da Saúde,
dando conta de que 693 crianças até 5 anos morreram entre janeiro e novembro de
2013.
O presidente do Cimi e bispo do Xingu, Erwin Kräutler, acusa o Poder Público de
agir com descaso em relação à política indigenista e à vida dos povos
indígenas. Na avaliação da organização, a paralisação dos procedimentos
demarcatórios, pelo governo federal, acirram conflitos em diversas unidades da
federação, intensificando as violências e ameaças de morte contra índios de todo
o país e suas lideranças.
Segundo o relatório apenas uma terra indígena foi homologada pela presidenta
Dilma Rousseff em 2013, a Terra Indígena Kayabi, no Pará. A média de
homologações durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002) foi 18
homologações por ano. No governo Lula (2003 a 2010), a média anual foi 10
terras homologadas.
Kräutler afirma que o governo federal deve ser responsabilizado pela trágica
realidade vivida pelos povos indígenas, lembrando que, pela Constituição
Federal, o Estado brasileiro deveria ter identificado, demarcado e retirado os
não índios de todos os territórios tradicionais indígenas até 1993.
Segundo o Cimi, das 1.047 áreas reivindicadas por povos indígenas, apenas 38%
estão regularizadas. Cerca de 30% delas estão em processo de regularização e
32% dos casos, sequer o procedimento de demarcação foi iniciado. Das terras já
regularizadas, 98,75% são na Amazônia Legal. Enquanto isso, 554.081 dos 896.917
indígenas vivem em regiões do país, que têm apenas 1,25% da extensão das terras
indígenas regularizadas.
O Cimi afirma que ao menos 30 processos demarcatórios relativos a áreas já
identificadas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) não têm pendência
administrativa ou judicial que impeçam a homologação da reserva. Ainda assim,
não são concluídos. Desses 30 processos, 12 dependem apenas da publicação, pelo
Ministério da Justiça, de Portaria Declaratória. Dezessete áreas aguardam à
homologação presidencial e cinco processos dependem da aprovação da presidenta
da Funai, Maria Augusta Assirati.
O
governo de Mato Grosso do Sul informou à Agência Brasil que ainda não tem conhecimento dos
dados citados no relatório. Disse ainda que "a segurança das aldeias e a
proteção aos indígenas são responsabilidades federais" e que a questão
fundiária é "competência exclusiva da União".