Raimundo
Brechó estava ‘marcado para morrer’ por sua luta de duas décadas pela posse da
área do Campestre/Alegria, que incomodava grileiros e madeireiros
Atingido a tiros por um pistoleiro, na sexta-feira (21), o líder
agrário Raimundo Rodrigues da Silva, de 42 anos, conhecido como “Brechó”,
morreu na madrugada de terça (25) no Hospital Municipal de Timbiras (a
318 quilômetros de São Luís, no leste maranhense).
“Brechó”
foi alvejado numa emboscada, às 9h de sexta, na estrada vicinal que interliga a
sede do município à comunidade Abundância, onde o trabalhador morava. Ele levou
dois tiros de espingarda calibre 12 – um na costela e outro no braço.
Internado no hospital de Timbiras, “Brechó” ainda foi vítima de
uma segunda tentativa de assassinato, quando, no sábado (22), dois homens
desconhecidos tentaram invadir a unidade de saúde com a intenção de “terminar o
serviço”.
Com isso, o assessor jurídico da CPT-Maranhão, Diogo Cabral,
encaminhou ao ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino Filho, relatório
sobre o caso e solicitou a presença de policiais para garantir a segurança do
lavrador, além da inclusão dele no Programa de Defensores de Direitos Humanos.
A suspeita de representantes de entidades ligadas à luta no
campo no Maranhão é de que Júlio Nunes Aguiar, de 20 anos, também morador da
comunidade Abundância, seria o autor dos disparos que mataram Raimundo Brechó. Júlio
é filho do latifundiário Antonio Leite de Aguiar, o “Citônio”.
Raimundo Brechó foi assassinado em decorrência de um conflito de
terras que se arrasta há várias décadas na região. Há pelo menos 20 anos,
“Brechó” lutava pela libertação do território Campestre/Alegria, região de
passagem da Balaiada, grilada por latifundiários.
O
processo de desapropriação das terras tramita há vários anos no Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), sem nenhuma solução concreta
para as mais de 350 famílias que vivem no latifúndio improdutivo.
Apesar das inúmeras denúncias feitas pelas famílias e pela
Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Incra não deu fim ao conflito. A grilagem
de terras e o latifúndio continuam ameaçando os trabalhadores agrários da região.
Na área, há também forte atuação de madeireiros, que destroem o
cerrado na localidade, uma das poucas terras preservadas da região maranhense
dos Cocais.
Em
2013, “Brechó” já havia sofrido ameaças de morte e uma tentativa de homicídio.
Com isso, o nome dele entrou para a lista de ameaçados da CPT.
Durante a tentativa de homicídio, em 2013, pessoas desconhecidas
efetuaram três disparos de arma de fogo na direção do trabalhador, que não foi
atingido.
Raimundo Brechó já havia registrado vários boletins de
ocorrência na polícia, sem que as autoridades tomassem providências.
Num dos boletins, ele denunciou que pessoas desconhecidas
rondavam a casa em que ele vivia com a mulher e três filhos, na comunidade
Abundância, e que em algumas noites ele havia escutado pisoteio de gente no
quintal.
As pessoas envolvidas no conflito contra a comunidade são
criadores de gado e madeireiros, aliados ao latifúndio, que há anos causam
prejuízo às famílias do Campestre. No caso dos pecuaristas, estes provocam a
permanente destruição das roças dos lavradores, uma vez que o gado é criado
solto.
Isso é incentivado por proprietários amigos da família Alvim,
que controlou esse território por mais de 50 anos, no mais truculento estilo do
coronelato.
O intuito dos criadores de gado e dos madeireiros é de que o
conflito se acirre e eles retomem o território, que hoje é ocupado pelos
lavradores.
O assassinato de Raimundo Brechó também está sendo investigado
pelo delegado de Polícia Civil agrário do Maranhão, Carlos Augusto Silva Coelho.
Com mais esta morte, o Maranhão mantém-se entre os estados com
mais assassinatos ligados a conflitos agrários. Em 2013, ocorreram 3
assassinatos de lavradores no estado – no Projeto de Assentamento Capoema (Bom
Jesus das Selvas), no P.A Sit (Santa Luzia do Tide) e no P.A Santa Maria 2
(Satubinha).
As lideranças agrárias ameaçadas de morte somam quase 50 em todo
o estado, segundo levantamento de 2013 da CPT.