Depois de 50 anos do primeiro
transplante de órgãos no Brasil, ainda são muitas as famílias que se recusam a
doar os órgãos de um parente que teve morte cerebral. Segundo o cirurgião-geral
presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), Lúcio
Pacheco, para que haja uma mudança, as pessoas devem se declarar doadoras para
seus parentes, e não adiar essa conversa para situações de emergência.
Dados
de 2013 mostram que, em todo o Brasil, 47% das famílias se recusaram a doar os
órgãos dos seus entes que tiveram morte cerebral, um número maior do que o de
2012, que teve 42% de recusa, segundo a ABTO. “O brasileiro não mudou, continua
sendo povo generoso. A mudança talvez tenha sido que o brasileiro tem
conversado menos sobre o assunto em casa. A campanha feita pela ABTO é
exatamente no sentido de as pessoas falarem sobre isso com seus parentes”,
avalia Pacheco.
A
campanha "Eu Assumi", lançada este mês pela ABTO
pretende estimular as pessoas a se declararem doadoras em casa, para suas
famílias. Outra ferramenta que pode ser usada para esta declaração são as redes
sociais. “Mas é importante ressaltar que a doação só pode ser feita depois da
morte cerebral. Nenhum documento feito em vida é válido para a doação de
órgãos. A decisão é da família, que costuma seguir a orientação do ente que
morreu”, explicou o cirurgião.
Segundo Pacheco, quando a mídia
divulga casos de doação de órgãos, há um estímulo à conversa sobre o assunto.
“Quando houve o caso trágico do assassinato da Eloá em Santo André (São Paulo),
o índice de doação chegou a 90%. As pessoas discutiram o tema e expuseram que
eram doadoras. Isso mostra que só falta diálogo“.
Dados
da ABTO mostram que o Brasil ocupa o trigésimo lugar em número de transplantes
quando este número é relacionado ao número de habitantes do país. Já em número
absoluto de cirurgias, o país só perde para os Estados Unidos.
Em 2013
foram feitos 7.649 transplantes de órgãos sólidos no Brasil. Até o final de
2013 a fila de espera por um órgão era de quase 24 mil pessoas.
Para o
presidente da Associação dos Doentes e Transplantados Hepáticos do Estado do
Rio de Janeiro, Carlos Roberto Cabral, que recebeu um fígado há 11 anos, faltam
campanhas informativas sobre o tema. “As campanhas costumam ser mais emocionais
do que informativas. Precisamos que as pessoas saibam como funciona a doação,
que ela não oferece riscos, como é detectada a morte encefálica...”, defendeu
Cabral.
Ele
recebeu o fígado depois de dois anos na fila de espera. Cabral sofria de
colangite esclerosante primária e já não sentia o sabor dos alimentos. “Fui
internado 28 vezes em três anos. Eu tinha crises com dores horríveis que podiam
me levar a morte”, lembrou Cabral, que depois do transplante tem uma vida
normal.
O
primeiro transplante de órgão feito no Brasil aconteceu em 19 de abril de 1964,
quando um rim foi transplantado no Rio de Janeiro. O rim é o órgão mais
transplantado em todo o mundo, seguido pelo fígado.
